DARK SOULS É UMA OBRA DE ARTE.

Dark Souls é indubitavelmente uma obra-prima de notável envergadura, destacando-se como uma pérola inigualável neste vasto repertório de jogos da atualidade.

Esta obra alcançou notoriedade sob o estigma de sua 'elevada dificuldade'. Contudo, aqueles mais versados que se aventuraram em suas profundezas reconhecem, com louvor, que tal reputação é, de fato, uma simplificação excessiva. A concepção de dificuldade atribuída a este jogo carece de substância, visto que Dark Souls ostenta uma progressão linear que se contrapõe ao primoroso design de jogo e à narrativa que almeja transmitir. Diferentemente de outras narrativas ludológicas, onde o protagonista é investido de poderes heróicos e destinos grandiosos, aqui, o jogador encarna a mais humilde das criaturas, a mais desvalida das almas, relegada ao anonimato em um asilo, uma verdade árida que é impiedosamente escancarada desde os primórdios da experiência. Conquistar a vitória tão cobiçada por tantos requer mérito, pois a jornada proposta não é uma empreitada que se afigura acessível a qualquer ser. No que tange ao desenvolvimento das habilidades do jogador em virtude da dificuldade, é notável que o início da jornada é permeado por desafios árduos, mas ao mesmo tempo edificantes. Logo no embate com o primeiro adversário de grande porte, o jogo instrui o jogador em todos os aspectos cruciais que serão necessários adiante: compreender os padrões de ataque do oponente, estudar minuciosamente o adversário e, sobretudo, dominar a arte de esquivar-se. A partir desse ponto, cada adversário se torna mais maleável, dependendo da diligência e da determinação do jogador em compreender os meandros de seus movimentos.

Um dos aspectos mais proeminentes que salta aos olhos desde os primórdios desta magna obra é a sua beleza artística. Em consonância com os demais títulos concebidos pela FromSoftware, Dark Souls ostenta uma direção artística que rivaliza com as obras dos mestres renascentistas, ou até mesmo com as páginas da aclamada série Berserk, adotando um estilo sombrio medieval, um cenário desolado e uma atmosfera impregnada de desespero e desolação. O jogo transporta o jogador para um mundo que já não mais existe, um cadáver de uma civilização outrora gloriosa e radiante. Esta dicotomia é particularmente palpável na majestosa cidade de Anor Londo, cuja paisagem é capaz de deter qualquer jogador em seu caminho, inspirando-o a apreciar e eternizar tal visão através de capturas de tela. Contudo, essa beleza é efêmera, uma ilusão vazia desprovida de vida, um testemunho do esplendor que um dia foi. Em suma, a direção artística deste jogo é impecável, meticulosamente elaborada, uma verdadeira obra de arte que justifica ser contemplada.

A narrativa, por sua vez, é bela, porém enigmática, confusa e cativante, evocando uma gama de emoções que oscilam entre o êxtase e a melancolia, em um enredo marcado por traições e desventuras, assemelhando-se à obra Berserk. Trata-se de uma saga que retrata uma terra assolada pela ganância e pela guerra, cujos detalhes não cabem ser exaustivamente abordados neste contexto. A narrativa adota um estilo não linear, permitindo ao jogador prosseguir em sua jornada sem necessariamente imergir na trama, refletindo assim uma faceta extremamente realista. O jogo simplesmente mergulha o jogador em um mundo cuja história já se desenrolou, incumbindo-lhe a tarefa de desvendar, por meio das pistas dispersas pelo cenário, os eventos que culminaram na situação atual. Em muitos momentos, compreender e decifrar essa narrativa pode se mostrar um desafio hercúleo, levando o jogador a buscar auxílio em vídeos explicativos disponíveis na internet. Todavia, para aqueles que dispõem do tempo e da disposição necessários, explorar esse universo por conta própria é uma experiência profundamente gratificante.

De longe, Dark Souls é o expoente máximo do excepcional design de níveis característico da FromSoftware, proporcionando uma liberdade de exploração que não se traduz em monotonia, graças a um mapa intricadamente conectado e meticulosamente planejado. O jogo também é exímio em manipular as emoções do jogador, evocando uma sensação de urgência e cautela em situações que exigem equilíbrio e destreza. Ao navegar por plataformas perigosamente inclinadas, cada passo em falso pode resultar em morte iminente, enquanto a presença de um veneno letal induz o jogador a agir com celeridade, sem tempo para hesitação. O design de níveis interconectados e o estilo reminiscente de Metroidvania conferem uma sensação de progressão inigualável, desafiando o jogador a utilizar itens encontrados em áreas avançadas para acessar locais anteriormente inacessíveis, revelando possibilidades que muitos sequer imaginavam existir. As cavernas de cristal são um exemplo exemplar desse engenhoso design, com seu piso invisível que demanda orientação através de faíscas cristalinas que emanam do teto. Nesse ambiente hostil, cada movimento precipitado é punido com a morte, evidenciando a habilidade do jogo em antecipar as ações do jogador e manipular suas emoções com maestria.

Em sua essência, o jogo personifica uma metáfora da jornada espiritual do homem. A luz eterna, manifestação da Lux Vera que procede do próprio Deus, é o princípio ordenador de toda a criação, pois, conforme ensina Santo Tomás de Aquino, Deus, enquanto actus purus, é a plenitude do ser e a causa primeira de tudo o que existe. Ao dizer "Fiat lux", Deus não apenas institui a ordem cósmica a partir do caos primordial, mas estabelece o próprio paradigma da realidade ontológica: a luz é o bem porque participa do Ser divino, enquanto as trevas são a privação desse ser, uma carência do princípio ordenador. Assim, a alma racional, criada à imagem e semelhança de Deus (imago Dei), possui sua finalidade última na participação dessa luz, pois é pela luz do intelecto divino que o homem compreende a verdade e se ordena ao bem. No entanto, ao afastar-se de Deus pelo pecado mortal, a alma não apenas se priva da graça santificante (habitus animae), mas se lança em um estado de dissolução ontológica, tornando-se como o hollow, cuja degradação não é um simples enfraquecimento, mas uma verdadeira descaracterização do ser. Em Dark Souls, o vazio é a ruína total do indivíduo, que perde sua identidade e vontade, reduzindo-se a um mero simulacro de existência; analogamente, na teologia tomista, o pecado mortal destitui a alma de sua ordenação teleológica, pois, ao rejeitar o Summum Bonum, ela se volta para bens inferiores de forma desordenada, rompendo sua hierarquia interior e tornando-se escrava de sua própria corrupção. Como ensina Santo Agostinho, o mal não possui substância própria, mas é a privação do bem, assim como as trevas não são um ente, mas a ausência de luz. Nesse sentido, a escuridão que devora os reinos de Dark Souls, especialmente manifesta no Abismo e na corrupção da humanidade, é a imagem da alma que, privada da graça, cai em um estado de dissolução e degradação, incapaz de retornar por si mesma ao lumen gloriae. Gwyn, ao sacrificar-se para perpetuar a chama, buscava evitar a consumação desse destino, mas, em sua tentativa de postergar o inevitável, apenas impôs um ciclo de sofrimento, tal como o homem, quando busca, por suas próprias forças, restaurar-se sem a graça divina, perpetua seu próprio declínio. A verdadeira salvação, conforme ensina a teologia católica, não reside em esforços meramente naturais, mas na reintegração da alma à luz incriada do Verbo, que é a Lux Mundi, única capaz de restaurar a ordem perdida. Assim, a alma que se aparta da luz divina experimenta a mesma ruína que acomete os vazios: a perda da identidade, da finalidade e do próprio ser. Somente pela graça – o fogo divino que não se extingue – a alma pode ser reintegrada à sua finalidade última, voltando-se novamente à visio Dei, na qual encontra a plenitude de seu ser e repousa na luz eterna, pela qual foi criada e à qual é chamada a retornar.